Relatórios do programa Fazendo Justiça destacam avanços no campo da privação de liberdade

Programa coordenado pelo CNJ, com apoio técnico do PNUD, visa superar a situação de inconstitucionalidade nas prisões brasileiras.

11 de October de 2022
Crédito: CNJ

Com 28 ações simultâneas nos ciclos penal e socioeducativo, o programa Fazendo Justiça encerrou mais uma etapa com relatórios de gestão que destacam os avanços realizados entre 2020 e 2022. O programa é coordenado pelo Conselho Nacional de Justiça com o apoio técnico do PNUD e dá sequência à parceria iniciada em 2019 para superar a situação de inconstitucionalidade nas prisões brasileiras, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal. 

Relatório de Gestão apresenta os avanços na condução das atividades definidas no planejamento nacional para o período, enquanto o Relatório Unidades da Federação detalha como esse plano resultou em atividades conduzidas pelos tribunais estaduais e federais com apoio da rede de atores locais. As ações do programa são alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, notadamente o ODS 16 - Paz, Justiça e Instituições Eficazes.

Mesmo com as limitações impostas pela pandemia para atuação em campo, o programa avançou na estruturação e execução de ações com apoio de instituições em diferentes níveis federativos, incluindo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, por meio do Departamento Penitenciário Nacional, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Durante o período, foram realizados pelo menos 33 eventos com alcance nacional e internacional, grande parte disponível online. Houve também o lançamento de 41 publicações técnicas e 76 produtos informativos (cartilhas, fôlderes, vídeos), além de apoio técnico a 20  normativas publicadas pelo CNJ, que produziram efeitos na edição ou atualização de 142 normativas locais em todo o país. 

 

Entrada

Para permitir uma atuação mais proporcional do Estado no campo penal, evitando a prisão como principal resposta, o Fazendo Justiça trabalhou metodologia inédita para controle permanente da ocupação prisional: a Central de Regulação de Vagas. Assim como um leito de hospital não pode ser preenchido por duas pessoas, nem uma vaga na escola pode ser ocupada por dois estudantes, o objetivo da CRV é unir tecnologia, articulação interinstitucional e aperfeiçoamento administrativo para que a mesma lógica seja aplicada no campo penal. A primeira Central deve ser implantada no Maranhão, onde já foi assinado termo de cooperação técnica, e outras duas estão em tratativas no Acre e na Paraíba.

Já a parceria com o UNODC impulsiona o fortalecimento das audiências de custódia, incluindo a retomada das atividades presenciais em 12 unidades da federação após o período de pandemia e a interiorização em 69 comarcas e pólos regionais. Nos últimos dois anos, o programa difundiu atualizações técnicas do primeiro ciclo do projeto a mais de 5.800 participantes em eventos e formações, com destaque para a Rede de Altos Estudos em Audiências de Custódia, que reuniu 846 magistradas e magistrados compartilhando conhecimentos na área. No campo da proteção social, há 26 unidades do Serviço de Atendimento à Pessoa Custodiada em 21 estados atuando segundo o modelo do CNJ. 

No campo das alternativas penais, o programa apoiou o CNJ para a reativação do Fórum Nacional de Alternativas Penais, com a realização de sua terceira edição, e facilitou a implantação de mais duas Centrais Integradas de Alternativas Penais no país, em Roraima e Mato Grosso do Sul. Deu também apoio técnico à resolução do CNJ que regulamentou a monitoração eletrônica no país e segue realizando eventos e formações para orientar tribunais, magistrados, magistradas e outros atores de interesse para adesão à normativa. O projeto Rede Justiça Restaurativa ampliou a oferta desse serviço para 10 tribunais, tanto no campo penal quanto no socioeducativo, com mais de 1.200 pessoas envolvidas em formações e capacitações.

 

Cidadania

Além de fomentar a cidadania no cumprimento da pena, qualificando inspeções judiciais e iniciativas relacionadas a leitura, esporte, saúde, e geração de trabalho e renda, o programa contribuiu para 22 novos Escritórios Sociais em 12 unidades da federação, totalizando 36 desde o início do programa. Trata-se de locais multisserviços para atendimento às pessoas que cumpriram pena e buscam apoio com necessidades básicas, como abrigo temporário, alimentação, assistência jurídica, capacitação profissional, atendimento de saúde e documentação. Um aplicativo para celular (ESVirtual), que reúne diversos serviços relevantes ao público egresso, foi lançado com a participação do então presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, e já conta com 5 mil downloads.

Em outra frente para facilitar o acesso a políticas públicas, o programa vem apoiando soluções para identificação civil e emissão de documentos a pessoas que tiveram contato com o cárcere. Após a distribuição de mais de 5,4 mil kits para identificação civil por biometria para tribunais, administrações penitenciárias, seções da justiça federal, comandos da justiça militar e penitenciárias federais, foram implantados fluxos permanentes para essa finalidade em 13 unidades da federação. Ao todo, já são 10 mil pessoas incluídas na base de identificação do TSE, e a cobertura nacional da ação está prevista para 2023. Também foram estabelecidos fluxos de emissão de documentos em 23 UFs, totalizando em 9,7 mil protocolos concluídos para regularização de documentos.

 

Socioeducativo

Com uma redução de 50% na ocupação de unidades socioeducativas desde 2019, o programa atuou para a implantação das audiências concentradas em 12 unidades federativas, prática que garante mais agilidade na avaliação da situação de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas no Brasil. Foi desenvolvida a metodologia Programa Pós-Medida Socioeducativa, que acompanha adolescentes por até um ano na transição da internação ou semiliberdade para a liberdade, com adesão do Ceará e o fortalecimento de programas já em andamento em outras localidades.

A partir de decisão do STF que impede superlotação no socioeducativo, o programa apoiou a implementação das Centrais de Vagas em 9 UFs. Também trabalha para fomentar núcleos e fluxos de atendimento inicial integrado para adolescentes que chegam ao sistema socioeducativo. Dois novos estados passaram a contar com o serviço - Ceará e Goiás -, totalizando sete no país.

 

Sistemas e cadastros 

Com a nacionalização concluída na primeira etapa do programa, o Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU) seguiu em evolução nos últimos dois anos, integrando processos de execução penal em todo o país para mais agilidade na tramitação e garantias processuais. Houve expansão para mais cinco tribunais, totalizando 34 tribunais operando o SEEU, além de ações de capacitação e monitoramento. Foram entregues também novas funcionalidades, a exemplo da inclusão de campos para pessoas com vulnerabilidade acrescida, e realizados novos desenvolvimentos, a exemplo da integração com a Plataforma Digital do Poder Judiciário em andamento. 

O programa também trabalha ferramenta semelhante para integrar processos que acompanham o cumprimento de medidas socioeducativas, a Plataforma Socioeducativa, com previsão de lançamento no final de 2022.  Ainda no campo socioeducativo, está em produção o novo Cadastro Nacional de Inspeções em Unidades e Programas Socioeducativos (CNIUPS), que apoiará o Judiciário na qualificação de inspeções nesse campo, assim como na sistematização de informações relacionadas.

 

Próximos passos

O desafio do encarceramento é global - o número de pessoas presas no mundo aumentou em ritmo maior que o crescimento populacional nas últimas duas décadas -  25% ante 21% -, sendo que das 11,7 milhões de pessoas encarceradas em 2019, mais de 700 mil estavam no Brasil. Além de consequências para gestão e financiamento, a prisão traz ainda um elevado custo social para o país com impactos para o ideal de um desenvolvimento inclusivo e sustentável. 

O programa segue em implantação de forma alinhada às prioridades da atual gestão do CNJ para a proteção a direitos humanos com base na legislação em vigor e eficiência da prestação jurisdicional. O objetivo é garantir que a execução penal e o cumprimento de medidas socioeducativas estejam de acordo com as sentenças judiciais e obedeçam a Constituição Federal, a Lei de Execução Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, assim como outras normas nacionais e internacionais em vigor no Brasil.

O programa dialoga com diversas ações listadas como prioritárias pela ministra Rosa Weber, considerando as especificidades da privação de liberdade, em especial a que prevê a efetividade na aplicação do direito infracional e penal, incluindo a dignidade na execução penal e de medidas socioeducativas, com foco na integração dessas pessoas à sociedade.