Surfando a onda digital: a América Latina e o Caribe aproveitarão a oportunidade de transformar sua produtividade?

Uma das principais preocupações em torno da IA está relacionada a seu potencial de transformar o cenário de empregos com o surgimento de novas ferramentas e recursos.

29 de April de 2024

A América Latina e o Caribe têm baixa exposição à IA, com seis em cada dez empregos aparentemente "isolados" da disrupção.

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A Inteligência Artificial (IA), definida como a capacidade de máquinas e sistemas de adquirir e aplicar conhecimento e executar comportamentos que se assemelham à inteligência humana, parece estar por toda parte atualmente: no discurso político, em exposições de museus de arte, em greves trabalhistas ou como um dos termos de pesquisa que mais cresceram no Google entre 2022 e 2023.

Uma das principais preocupações em torno da IA está relacionada a seu potencial de transformar o cenário de empregos com o surgimento de novas ferramentas e recursos. Neste #GraphforThought, o PNUD examina o impacto esperado da IA nos mercados de trabalho e na produtividade na América Latina e no Caribe (ALC).

Usando dados do FMI (2024), o gráfico a seguir mostra as pontuações de exposição (o potencial da IA para substituir ou transformar tarefas e empregos, possivelmente eliminando-os ou alterando-os radicalmente) e de complementaridade (o papel da IA como uma tecnologia facilitadora que pode aumentar a produtividade do trabalho) para a ALC. 

A América Latina e o Caribe têm baixa exposição à IA, com seis em cada dez empregos aparentemente "isolados" da disrupção. Dos 40% de empregos restantes, em média, apenas um em cada dez (12,6%) apresenta alta complementaridade com a IA, em que essa tecnologia poderia aumentar a produtividade dos trabalhadores se eles reforçassem suas habilidades digitais. Esse isolamento é um mau sinal, pois indica uma falta de preparo da região para participar dessa nova revolução tecnológica e capitalizá-la. Nas economias avançadas, a inteligência artificial melhorará um em cada quatro empregos, enquanto apenas um em cada oito será melhorado na América Latina e no Caribe. A região está perdendo a oportunidade de aproveitar a revolução tecnológica associada à inteligência artificial.

Infelizmente, essa não seria a primeira vez que a América Latina e o Caribe perderam a oportunidade de se beneficiar de uma revolução tecnológica. Observando as tendências de produtividade nas últimas seis décadas, vemos que, antes do início da terceira revolução industrial, que marcou a era da digitalização, da automação e da internet, a produtividade da região superava a de países como Singapura e Coreia do Sul. No entanto, enquanto os países asiáticos aproveitaram as oportunidades oferecidas pela digitalização para fortalecer suas economias, os níveis de produtividade em nossa região permaneceram estagnados, aumentando apenas marginalmente de 25% para 27,8% nos últimos 50 anos (de 1970 a 2017).

Os países que aproveitaram a terceira revolução industrial, como a Coreia do Sul e Singapura, fizeram isso, em parte, por meio de investimentos educacionais substanciais, políticas que promovem o crescimento liderado por exportações e um ambiente macroeconômico estável. Em contrapartida, na América Latina e no Caribe, vários fatores que se sobrepõem, como um contexto econômico e social altamente volátil, um tecido produtivo caracterizado por altos níveis de informalidade, a predominância de empresas pequenas de baixa produtividade, a baixa diversificação econômica e algumas tendências protecionistas, impediram que a região se beneficiasse dos avanços tecnológicos. Infelizmente, muitas dessas características persistem até hoje, principalmente um mercado de trabalho altamente informal (conforme abordado no Capítulo 5 do Relatório de Desenvolvimento Humano Regional 2021 do PNUD), dificultando as perspectivas da região de aproveitar essa nova onda de revolução tecnológica.

Além disso, é essencial fortalecer a igualdade de gênero nos campos STEM (sigla em inglês para ciência, tecnologia, engenharia e matemática) e abordar as barreiras que as mulheres enfrentam nessas áreas. Apesar de representar 41% da força de trabalho na América Latina e no Caribe, apenas 14% das mulheres trabalham em áreas relacionadas a STEM, em comparação com 32% dos homens. Embora as mulheres ainda enfrentem desafios consideráveis para romper as barreiras na força de trabalho, a região tem número significativo de pesquisadoras, com participação de 45%, bem acima da média global de 28%. Isso indica uma oportunidade inexplorada que poderia ajudar os países a aproveitarem o poder da IA e da digitalização, melhorando a inclusão e a produtividade.

Como podemos garantir que a América Latina e o Caribe não percam as oportunidades de uma nova revolução tecnológica? É imperativo criar ecossistemas robustos por meio de políticas públicas sistêmicas, reformas educacionais transformadoras e envolvimento do setor privado. Entretanto, essa abordagem deve envolver uma estratégia regional abrangente que vá além das iniciativas específicas de cada país. Como indica o novo Relatório de Desenvolvimento Humano 2023/2024, do PNUD, devemos buscar uma mudança em direção a uma melhor cooperação regional e global, junto ao multilateralismo. Ações concretas, como o foco na melhoria da educação, especialmente em STEM, a modernização das infraestruturas digitais e a criação de mercados de trabalho compatíveis com as demandas de uma economia global tecnologicamente avançada, ajudarão a aproveitar todo o potencial da digitalização e da IA e a garantir um desenvolvimento inclusivo e sustentável para a América Latina e o Caribe.