PNUD e Piauí apoiarão trabalhadores rurais de áreas desertificadas do estado

Novo projeto atuará em municípios que detêm as cinco maiores áreas de desertificação do Piauí e, juntos, concentram 67% de toda a área do estado.

14 de November de 2022
Luciana Bruno/PNUD Brasil

A piauiense Rita Oliveira, 39, é líder do sindicato de trabalhadores rurais de São Gonçalo do Gurgueia (PI), município afetado por processo de desertificação. Ela afirma que as principais demandas dos pequenos produtores locais são segurança hídrica, técnicas de manejo do solo degradado e acesso a tecnologias sociais para uma agricultura sustentável e produtiva.

Essas são justamente as linhas de ação de projeto lançado por PNUD e Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Piauí (Semar) na região. A iniciativa é financiada por uma empresa de energia renovável.

“Registramos muitas perdas. Quando chove muito, o pequeno produtor rural acaba perdendo. Quando tem sol demais, perde também, porque a terra aqui é seca”, explicou Oliveira. “Os agricultores acabam fazendo novas tentativas, mesmo perdendo as sementes. Mas isso é muito custoso”, declarou a líder sindical.

Luciana Bruno/PNUD Brasil

A desertificação é um processo de degradação ambiental que ocorre em áreas áridas, semiáridas e subúmidas secas da Terra, resultante de atividades humanas e variações climáticas. A desertificação também amplia os efeitos da mudança global do clima por meio de alterações na cobertura vegetal, tempestades de areia e fluxos de gases de efeito estufa.

No Brasil, 94% do Semiárido nordestino está sujeito à desertificação, segundo relatório de 2019 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Estima-se que até 50% da região tenha sido degradada devido a secas prolongadas frequentes e desmatamento, o que ameaça a extinção de cerca de 28 espécies nativas.

Nesse cenário, o projeto “Desenvolvimento Sustentável de Áreas de Desertificação no Sul do Piauí” identificou as cidades da Chapada das Mangabeiras como prioritárias para intervenções da iniciativa “ODS Piauí”, estruturada pelo governo estadual e o PNUD para impulsionar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no estado.

Os municípios beneficiados pelo projeto, cujo prazo é de dois anos, incluem São Gonçalo do Gurguéia e as cidades de Gilbués, Corrente, Barreiras do Piauí e Riacho Frio, que detêm as cinco maiores áreas de desertificação do Piauí e concentram 67% de toda a área do estado.

A iniciativa prevê garantir a segurança hídrica da população por meio da instalação de novos poços e sistemas de distribuição; realizar capacitações com a população sobre manejo do solo degradado e uso responsável da água; capacitar gestores públicos sobre questões ambientais; ampliar a produção de alimentos com tecnologias sociais inovadoras; entre outras ações.

Luciana Bruno/PNUD Brasil

Missão no Piauí

O lançamento do projeto foi marcado por uma missão realizada em setembro na capital do Piauí e nos municípios a serem beneficiados. Na ocasião, oficiais do PNUD reuniram-se em Teresina com o secretário do Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Piauí, Daniel Marçal, que falou sobre a necessidade de apoiar agricultores em um cenário de degradação do solo.

“O projeto tem extrema importância, por ser voltado ao fortalecimento das comunidades rurais naquela região, por meio do acesso aos recursos naturais necessários para suas atividades, como água, técnicas de recuperação do solo e, principalmente, ações voltadas para o fortalecimento da agricultura familiar”, disse Marçal.

A iniciativa estrutura-se em quatro eixos estratégicos. O primeiro inclui o diagnóstico sobre a situação socioeconômica dos beneficiários diretos e o potencial do desenvolvimento territorial sustentável com base nos ODS. Tal etapa prevê a articulação de espaços e atores institucionais e informais de participação social, assim como a elaboração de um plano de ação.

O segundo eixo prevê capacitação de comunidades, agentes públicos e multiplicadores em práticas de associativismo, uso de técnicas para manejo sustentável do solo para a agricultura e pecuária sustentável e em tecnologias sociais. Essa fase também inclui um programa de educação ambiental para professores e alunos da rede pública de ensino.

Já o terceiro eixo introduzirá práticas de manejo produtivo e ambiental por meio de tecnologias capazes de gerar desenvolvimento social e contribuir para a produção sustentável, sem causar degradação da terra nas áreas suscetíveis à desertificação. Tais tecnologias podem ser fogões ecológicos, cisternas de captação e de água, produção e instalação de unidades sanitárias, sistema de reaproveitamento de água cinza, entre outras.

A parceria aborda ainda a igualdade de gênero em todas as suas etapas como forma de empoderar meninas e mulheres nos territórios, contribuindo para alcançar resultados mais efetivos na produção de alimentos e na geração de renda.

A Secretaria de Planejamento do Piauí (Seplan) também terá envolvimento no projeto, por meio dos agentes territoriais e dos Conselhos de Desenvolvimento Territorial Sustentável, instâncias participativas de controle social que atuam na priorização de políticas públicas.

A missão de oficiais do PNUD no Piauí foi marcada por encontros com secretários das prefeituras beneficiadas, que manifestaram a necessidade de soluções inovadoras para ampliar a produção local e a comercialização dos produtos da agricultura familiar como forma de erradicar a pobreza no meio rural.

“Toda a estratégia de execução do projeto é fruto de diálogo com os municípios envolvidos. As prefeituras serão responsáveis por identificar e priorizar áreas-piloto onde serão adotadas as tecnologias sociais para incrementar as cadeias produtivas”, explicou a Assessora de Cooperação Descentralizada do PNUD, Ieva Lazareviciute.

“O projeto vai contribuir para ampliar a consciência coletiva sobre os modelos de desenvolvimento, bem como identificar possíveis rotas alternativas, fundamentadas em informações e indicadores relacionados com as dinâmicas locais”, completou. 

Luciana Bruno/PNUD Brasil

Contexto ambiental

Relatório publicado pelo IPCC em 2021 projeta aumento das temperaturas e dos períodos de seca no Nordeste do Brasil, com uma redução de 22% das chuvas, o que deve reduzir a produtividade agrícola no curto prazo (até 2030), ameaçando a segurança alimentar da população mais pobre.

O documento prevê que o cenário de mudança global do clima provocará uma diminuição da disponibilidade de água para irrigação agrícola no Nordeste brasileiro, o que potencialmente impulsionará migrações em grande escala na região.

Diante disso, o IPCC afirma que algumas medidas de adaptação podem ser adotadas, incluindo o manejo de cultivo e uma melhor gestão do uso da água na agricultura, juntamente com melhoramento genético de plantas.

A necessidade de aprender técnicas para um melhor manejo de solo degradado foi apontada por Maria Aparecida Borges, 31, agricultora de São Gonçalo do Gurgueia. Atualmente, sua família produz para o consumo próprio, mas tem ampliado a renda por meio da comercialização de hortaliças para o mercado local.

“A gente planta milho e feijão mais para o consumo da família, e criamos suínos, galinhas. Mas, há um ano, começamos a trabalhar com hortaliças para comercialização”, disse. Aí apareceram dificuldades, tais como a questão do melhoramento e estudo de solo. A capacitação seria boa para nos nortear, tanto na questão do cultivo, como na questão da venda para o mercado”, declarou.