"Comigo ou contra mim": A intensificação da polarização política na América Latina e no Caribe

Utilizando dados da Variety of Democracies (V-Dem), este #GraphForThought analisa o que aconteceu com a polarização na região durante as últimas duas décadas.

31 de March de 2023

 

Com base nas notícias e nas redes sociais, é fácil concluir que as sociedades da América Latina e do Caribe (ALC) estão mais divididas do que nunca. O mal-estar social, as disputas eleitorais apertadas e a paralisia legislativa são frequentemente atribuídos a elevados níveis de polarização. 

Utilizando dados da Variety of Democracies (V-Dem), este #GraphForThought analisa o que aconteceu com a polarização na região durante as últimas duas décadas. O V-Dem usa dados de pesquisas para medir se uma "sociedade está polarizada em campos políticos antagônicos” e como isso afeta a interação social. Define as sociedades como altamente polarizadas se os partidários de campos políticos opostos se mostrarem resistentes a interações amistosas como, por exemplo, em funções familiares, associações cívicas, atividades de lazer e locais de trabalho.

A crescente polarização política é uma tendência mundial. No entanto, a ALC é a região onde a polarização mais aumentou ao longo dos últimos 20 anos. No início dos anos 2000, a ALC pontuou muito abaixo da média global e foi a segunda região menos polarizada do mundo. Entretanto, a partir de 2015, a polarização começou a crescer mais rapidamente que a média global, ultrapassando-a por volta de 2017. Atualmente, a ALC encontra-se entre as regiões mais polarizadas do mundo, atrás apenas da Europa do Leste e da Ásia Central.

 

A região da ALC registrou o maior aumento da polarização política nos últimos 20 anos.

Para explicar o aumento da polarização, devemos distinguir dois fenômenos que ocorrem quando as sociedades se fragmentam em grupos (como definido no documento clássico de Esteban e Ray (1994)): a identificação vis-à-vis a alienação . Quanto mais pessoas se identificarem com um dado grupo e quanto mais características partilharem, mais forte será seu sentido de identificação com esse grupo. Ao mesmo tempo, quanto mais se identificarem com um grupo, mais forte será o sentimento de distanciamento em relação a outros que não partilham características específicas, entendido como alienação. 

Embora não sejam novos, os processos de identificação e alienação estão sendo cada vez mais moldados pela forma como consumimos a informação. À medida que mais pessoas recebem notícias e informação das redes sociais e da web, os algoritmos utilizam câmaras de eco ou filtros de bolha para decidir que tipo de informação é apresentada com base no histórico de busca e redes do usuário. Em termos de ideias políticas, esse algoritmo promove a criação de bolhas ideológicas que tendem a confirmar crenças políticas pré-concebidas. Como resultado, há um enfraquecimento da deliberação política, uma vez que as pessoas dificilmente são expostas a pontos de vista opostos. 

Quando as pessoas estão classificadas em posições antagônicas, o papel de uma terceira que possa fazer a mediação é crucial para processar o conflito. Nas sociedades modernas, esse é o papel das instituições estatais. Contudo, no caso de uma elevada polarização política, é menos provável que as instituições sejam vistas como mecanismos neutros para processar o conflito e não como instrumentos partidários para o exercício do poder. Quando esse se torna o caso, é mais provável que ocorram surtos violentos.

Os governos, porém, podem adotar políticas que construam uma base comum e reduzam a animosidade entre grupos, ajudando a manter sociedades pacíficas e contratos sociais que conduzam ao desenvolvimento. Repensar o sistema de proteção social através da lente da universalidade (ver Capítulo 5 do Relatório Regional do Desenvolvimento Humano 2021 para uma discussão completa sobre esse assunto) poderia reduzir a distância social e fomentar pontos de contato entre certos grupos sociais. Do mesmo modo, os espaços públicos de recreação, cultura e, de maneira mais geral, a provisão e a qualidade dos bens públicos também podem servir a esse propósito. Finalmente, a literatura sobre cognição social (Batson et al (1997)) mostra que induzir empatia por um membro de um grupo estigmatizado pode melhorar as atitudes para com o grupo como um todo.